GUARDA COMPARTILHADA 1 - Denise Duarte Bruno
Assitente Social (PUC - Campinas/1982),
Mestre em Sociologia (UFRGS/1995),
atua como Assistente Social Judiciária no Foro Central de Porto Alegre/RS,
dede 1986, participa da diretoria regional no Rio Grando do Sul do IBDFAM.
SUMÁRIO: Introdução; 1. Definições; 1.1 Guarda Repartida; 1.2 Guarda “Não Dividida”; 2. Indicações e Contra-Indicações da Guarda Compartilhada; 3. Fatores e Condições a serem Considerados na Avaliação da Guarda Compartilhada; 3.1 Fatores Intervenientes na Guarda Compartilhada; 3.1.1 Com Relação à Criança/Adolescente; 3.1.2 Com Relação à Família; 3.2 Condições a serem Consideradas para a Guarda Compartilhada; 4. Conclusões e Comentários sobre a Proposta de Legislação Brasileira de Guarda Compartilhada; a) Com Relação à Proposta de Lei; b) Com Relação à Implantação da Guarda Compartilhada nos Casos Concretos; Bibliografia.
Introdução
Todo e qualquer estudo sobre formas de definição da guarda de crianças em casos de ruptura (ou da não-existência) do laço conjugal de seus genitores, onde as estruturas familiares se organizam em torno de outras relações que não a conjugalidade, assume grande significado na sociedade contemporânea, onde cada vez mais se diversificam as formas de organização familiar.
Junto a tal diversidade e diretamente relacionada a ela, quer como causa ou como conseqüência, três outros fatores tornam relevante a questão da forma como se dão os cuidados e responsabilidades de genitores não-casados para com suas crianças. Esses fatores são: (1) o reconhecimento dos direito da criança de conviver com ambos os genitores; (2) o questionamento dos tradicionais papéis de gênero, que definiam a questão da guarda considerando a primazia da convivência das crianças com a mãe, ou seja, valorizava a função materna, e, finalmente, (3) definição da guarda a partir de questões morais, como culpa. 2
Os fatores que relacionamos acima, e outros mais, levaram a se pensar e a se organizar forma(s) de arranjos de guarda das crianças desvinculada da figura de um genitor isolado, ou do que se denomina “guarda dividida”, que define o arranjo no qual
o menor vive em um lar fixo, determinado, recebendo a visita periódica do pai ou mãe que não tem a guarda. É o sistema de visitas. (RABELO, s/d)
Os termos “guarda compartilhada” ou “guarda conjunta”, e alguns outros, têm sido correntemente utilizados para designar os arranjos que se diferenciam deste por visarem a manutenção do contato e da responsabilidade compartilhada de ambos os genitores para com a criança.
Uma breve e sucinta busca na literatura nos leva, porém, a rapidamente identificar uma variedade de termos e significados para este tipo de arranjo, bem como nos remete a tarefa de, antes de tudo, definir o que se entende por “compartilhada”, “conjunta”, “legal conjunta”, etc. Tentemos, portanto, entender um pouco a terminologia, destacando antes que, para fins deste texto, utilizaremos sempre o termo “guarda compartilhada”.
1 Definições
Na tentativa de clarificar os termos que definem arranjos de guarda diferentes daquele no qual um dos genitores é “o guardião” e o outro exerce o direito/dever de visitas, encontramos diferentes expressões com diferentes significados, bem como pelo menos duas críticas que dizem que tais termos podem, na verdade, apenas se referirem a diferentes formas de visitação mais ampla, definidas legalmente.
GOLDSTEIN et al. (1996), autores de uma destas críticas, afirmam que os diferentes termos (“conjunta”, “dividida” e “repartida”, segundo eles) são geralmente utilizados para descrever o mesmo arranjo, arranjo este que, como referimos, pode tanto simplesmente significar formas mais amplas de visitação, quanto
do ponto de vista da criança, a guarda parece ser “compartilhada” ou “dividida” tanto quanto “conjunta” dependendo da extensão do conflito de seus genitores separados. (p. 26 - nota) 3
Independente da observação destes autores, encontramos diversas expressões para designar arranjos de guarda que rompem com a guarda atribuída a apenas um dos genitores.
Para fins deste texto decidimos classificar tais expressões em dois grupos: um grupo de termos que definem arranjos onde ambos os genitores exercem a guarda de todos os filhos (que chamaremos de “guarda não dividida”), e outro grupo onde se define o arranjo em que cada genitor exerce a guarda de um (ou de alguns) dos filhos.
Os termos relacionados podem tanto ter algumas variantes nas definições, quanto um ou mais termos podem ter definições bastante similares, como poderemos ver na resenha a seguir.
Apresentaremos, em primeiro lugar, a definição do segundo grupo por entendermos que a mesma não se enquadra no tema desta apresentação, bem como única.
1.1 Guarda repartida
É o arranjo de cuidados e responsabilidades dos genitores para com os filhos definido por STAHL (1994) como sendo aquele no qual os primeiros
tem a custódia física de pelo menos uma criança no matrimônio, com direito de visitação específico de cada genitor à(s) criança(s) que não detêm a guarda. (p. 157)
1.2 Guarda “não dividida”
Os conceitos e termos utilizados para os tipos de arranjos de guarda explicitados a seguir, apesar de algumas nuances em suas definições, bem como em diferentes relações entre os termos e as definições, se considerarmos diferentes autores, levam sempre em conta a manutenção da relação próxima e constante entre os filhos e ambos os genitores.
a) Guarda compartilhada ou conjunta
Deve-se de pronto destacar que as expressões “conjunta” e “compartilhada”, embora sejam diferentes entre si, são usadas para definir o mesmo tipo de arranjo, como destaca RABELO (s/d) que define tais arranjos da seguinte forma:
Pais e mães dividem a responsabilidade legal sobre os filhos ao mesmo tempo e compartilham as obrigações pelas decisões importantes relativas à criança.
A advogada citada acima destaca que, neste tipo de guarda, “um dos pais pode deter a guarda material ou física do filho”, mas ambos tem os mesmos direitos e deveres para com a prole.
A definição de guarda conjunta para pelo menos um autor, STAHL (1994), refere-se de forma específica ao arranjo no qual ambos os genitores têm a “custódia física e legal conjunta de uma criança”. (p. 156)
Outras definições, como veremos a seguir, se fixam em aspectos tais como a questão da guarda física e da legal.
b) Guarda legal conjunta
O conceito de guarda legal conjunta refere-se àquele arranjo, determinado ou homologado judicialmente, no qual
os dois pais exercem conjuntamente a autoridade parental partilhando as decisões importantes, relativas, por exemplo, ao bem estar dos filhos, mas somente um dos genitores detêm a guarda física legal. (BASTIEN e PAGANI, 1996)
Ou seja, a criança vive com um dos genitores, mas o outro participa de todas as decisões, responsabilidades e de grande parte dos cuidados, sendo estes últimos divididos de comum acordo entre os pais. Este tipo de arranjo difere dos dois apresentados a seguir, que prevêem alternância na moradia das crianças.
c) Guarda física compartilhada
Neste tipo de arranjo, a criança vive alguns períodos com um dos genitores e outros períodos com o outro, ou seja, “o período de vida da criança é dividido entre as residências dos dois genitores”. (BASTIEN e PAGANI, 1996)
d) Guarda alternada
A guarda alternada, que prevê seu estabelecimento ou homologação judicial, implica em que por períodos de tempo pré-estabelecidos, geralmente de forma equânime entre ambos os genitores, cada um deles detenha “de forma exclusiva, a totalidade dos poderes-deveres que integram o poder parental”. (RABELO, s/d)
As duas formas apresentadas por último nos parecem equivalentes e, ao que tudo indica, são as que mais geram ansiedade e que tem a menor probabilidade de sucesso. A elas se contrapõe o arranjo no qual não são as crianças que mudam de casa, mas os pais, e se denomina:
e) Aninhamento ou nidação
Este tipo, apresentado por RABELO (s/d) como sendo “raro”, refere-se àqueles arranjos nos quais as crianças permanecem sempre morando na mesma casa e com as mesmas rotinas, sendo que os pais, por períodos alternados, se mudam para atender e conviver com os filhos.
Deixando de lado a última definição, tendo em vista que os estudos sobre os efeitos da guarda compartilhada nas crianças não a consideraram nem a referiram, a seguir apresentaremos algumas das implicações positivas e negativas dos arranjos de guarda com o envolvimento de ambos os genitores.
2 Indicações e Contra-Indicações da Guarda Compartilhada
Iniciaremos este tópico relacionando as ressalvas feitas à guarda compartilhada, porque a maioria dos estudos levantam mais aspectos positivos do que negativos.
A primeira, e óbvia, contra-indicação do estabelecimento (ou homologação) da guarda compartilhada refere-se à violência doméstica, quer seja comprovada ou que se tenham indícios significativos de que um dos genitores praticou qualquer ato de violência contra o outro ou contra um dos filhos.
Essa ressalva está presente, por exemplo, na legislação americana, sendo que a regulamentação do Estado do Arizona é bastante clara ao determinar que “guarda conjunta não deve ser considerada se a corte encontra a existência de violência doméstica significante … ou se a corte tem conhecimento ou evidência da preponderância de uma história de violência doméstica”. 4
Outra contra-indicação da guarda compartilhada, refere-se ao fato de que a separação conjugal sempre traz em si mágoas e ressentimentos, dificultando que os membros do ex-casal mantenham um relacionamento livre de conflitos. Esta contra-indicação assume relevância nos casos nos quais a guarda compartilhada é decidida ou homologada judicialmente, ou seja, quando ela não acontece na forma de um arranjo espontâneo entre os separandos.
GOLDSTEIN et al. (1996) destacam tal contra-indicação citando um estudo cujas conclusões são no sentido de que, sob a ótica da criança cuja guarda compartilhada foi decidida ou homologada judicialmente, seu bem-estar não está privilegiado, visto que a mesma “pode se sentir presa no meio do conflito parental (…) mesmo que este arranjo de custódia seja resultado de encorajamento feito por mediadores ou juízes”. (MACCOBY e MNOOKIN apud GOLDSTEIN et al., 1996, p. 250)
Outros pesquisadores também se referem ao conflito parental como sendo uma das possíveis contra-indicações ao estabelecimento da guarda compartilhada, destacando que a manutenção do contato entre os membros do ex-casal, requerido neste tipo de guarda, em certos casos pode provocar a continuidade da conflito entre eles, prejudicando as crianças.
Mais uma contra-indicação, relacionada em alguns textos que se opõem à guarda compartilhada, refere-se à instabilidade que tal arranjo pode gerar nas crianças envolvidas, instabilidade esta proveniente das freqüentes mudanças de ambiente.
Tal ressalva nos parece válida nos casos da guarda alternada, sendo expressiva a seguinte crítica:
Este é um tipo de guarda que se contrapõe fortemente à continuidade do lar, que deve ser respeitado para preservar o bem-estar da criança. É inconveniente à consolidação dos hábitos, valores, padrões e formação da personalidade do menor, pois o elevado número de mudanças provoca uma enorme instabilidade emocional e psíquica. (RABELO, s/d)
Contrapondo-se às ressalvas feitas à guarda compartilhada e à guarda alternada, temos os aspectos positivos que dão relevância ao seu estabelecimento.
O primeiro é o direito que toda criança tem de conviver com ambos genitores, direito este estabelecido em convenções nacionais e internacionais de direito e códigos elaborados a partir de tais convenções.
O segundo é a compreensão de que, se considerarmos a igualdade entre homens e mulheres, não só ambos têm o direito de conviverem com, e se responsabilizarem igualmente por, seus filhos, mas também que tal convivência é fundamental para a construção da identidade social e subjetiva das crianças.
As vantagens da guarda compartilhada (e até mesmo da alternada, se for o caso) podem ser relacionadas tanto a partir do ponto de vista dos filhos quanto dos genitores.
Sob a ótica dos filhos, a vantagem está expressa no direito de convivência acima referido, direito este que, segundo alguns estudos, “parece ser um aspecto determinante de ajustamento das crianças ao divórcio” de seus pais (BASTIEN e PAGANI, 1996). Ou seja, a guarda compartilhada reduziria as dificuldades que as crianças normalmente enfrentam em se adequarem às novas rotinas e aos novos relacionamentos após a separação de seus genitores.
Sob a ótica dos genitores, as vantagens são de três tipos, segundo o estudo canadense publicado por BASTIEN e PAGANI (1996). São elas:
I - redução do stress e do acúmulo de papéis do genitor que é guardião único;
II - favorece a que ambos os genitores compartilhem a educação dos filhos; e
III - ambos os genitores ficam mais satisfeitos, especialmente se decidiram entre si por tal tipo de guarda e não foi uma decisão judicial.
BASTIEN e PAGANI (1996) se posicionam no sentido de que tanto as indicações, quanto especialmente as contra-indicações da guarda compartilhada não são absolutas, devendo ser relativizadas levando-se em consideração alguns fatores intervenientes, relacionados às crianças ou à família.
Os fatores ou variáveis que interfeririam na adaptação das crianças/adolescentes à guarda compartilhada são relacionados abaixo e comentados brevemente logo a seguir. 5
I - variáveis individuais, ou seja, relacionadas ao(s) filho(s): idade, sexo e temperamento;
II - variáveis familiares: relação genitor/filho(s) e relação dos genitores entre si.
3 Fatores e Condições a Serem Considerados na Avaliação da Guarda Compartilhada
3.1 Fatores intervenientes na guarda compartilhada
3.1.1 Com relação à criança/adolescente
a) Idade
No que diz respeito à idade dos filhos quando da separação dos pais, há indicativos de que a adaptação ao pós-divórcio dos pais, independente do tipo de guarda, ocorre da mesma forma em diferentes faixas etárias, podendo se destacar o seguinte, no que diz respeito especificamente à guarda compartilhada, se considerarmos três faixas etárias para a separação dos pais e o estabelecimento do arranjo de guarda (compartilhada ou não).
Para os pré-escolares (0-5 anos), o estabelecimento da guarda compartilhada tem como contrapartida uma redução nos sentimentos de perda e abandono, mas com aumento do desejo de reconciliação entre os pais e o risco das crianças terem dificuldade em suportar a instabilidade, mesmo que os pais sejam afetivos e empenhem-se no arranjo realizado.
Por sua vez, crianças na fase escolar (6-11 anos) costumam ter problemas de ajustamento independente do tipo de guarda, sendo que a guarda compartilhada pode ser adequada para os anos finais dessa faixa etária: há indicativos de que os pré-adolescentes se adaptam bem a este tipo de guarda, desde que os horários sejam estáveis e os pais colaborem entre si.
Já no que diz respeito aos adolescentes (11-19 anos), as atividades fora do grupo familiar, típicas e necessárias nesta faixa etária, criam desvantagens em flexibilizar a organização dos horários da guarda compartilhada. Estudos não conclusivos indicam que os adolescentes podem tanto serem beneficiados quanto prejudicados pela guarda compartilhada.
b) Sexo
No que diz respeito aos ganhos que meninos e meninas possam ter em arranjos de guarda compartilhada, os autores citados apresentam duas conclusões:
I - meninos com problemas de ajustamento emocional tem dificuldades independente do tipo de guarda (KLINE, 1989 apud BASTIEN e PAGANI, 1996)
II - meninas em guarda única e meninos em guarda compartilhada têm maior nível de ansiedade do que meninas em guarda compartilhada e meninos em guarda única.
Ou seja, há estudos demonstrando que meninas se beneficiam mais do que meninos quando sua guarda é exercida em conjunto por seu pai e sua mãe, e que meninos têm maior dificuldade, seja qual for o arranjo de guarda (especialmente se têm problemas de ajustamento).
c) Temperamento e capacidade de adaptação
Segundo os autores já referidos, não há estudos que tenham avaliado de forma metódica e isolada essas variáveis, havendo apenas um indicativo e uma hipótese:
I - indicativo: crianças com temperamento difícil têm mais problemas em Qualquer que seja o tipo de guarda;
II - hipótese: o temperamento da criança influi na decisão dos pais, havendo uma tendência em se optar pela guarda compartilhada quando a criança tem temperamento mais fácil.
3.1.2 Com relação à família
b) Relação entre pais e filhos
A guarda compartilhada só é indicada se ambos os genitores têm boa relação com o(s) filho(s).
b) Relação dos genitores entre si
As dificuldades de relacionamento entre os genitores não podem ser de tal intensidade que os impeça de se comunicarem para realizarem arranjos quanto ao(s) filho(s).
Os fatores apresentados acima, quer com relação às crianças, quer com relação à organização familiar, embora possam servir de parâmetros quando da opção em estabelecer ou não a guarda compartilhada, são discutidos por BASTIEN e PAGANI (1996) em dois níveis:
I - provêm de pesquisas realizadas apenas em um estrato social, ou seja, as chamadas classes médias e altas;
II - as pesquisas não levaram em conta os processos familiares relacionados à decisão e as conseqüências do estabelecimento da guarda compartilhada.
As autoras discutem, ainda, o fato de que a adaptação das crianças à guarda compartilhada não depende de uma variável isolada, mas da interação de diversas variáveis.
Independente dessa interação, algumas condições devem ser consideradas antes do estabelecimento, judicial ou não, da guarda compartilhada (ou conjunta).
3.2 Condições a serem consideradas para a guarda compartilhada
Além de se descartar a necessidade de verificação da existência de violência doméstica (conforme referido no item 2), alguns pré-requisitos devem ser considerados quando do estabelecimento da guarda compartilhada.
Algumas dessas condições devem ser consideradas de forma preliminar, no momento mesmo em que se considera a possibilidade da guarda compartilhada, e outras devem ser foco de atenção especial quando se regulamenta este tipo de arranjo.
As condições ou pré-requisitos que devem ser considerados preliminarmente dizem respeito às condições e capacidades dos genitores, e referem-se a quanto cada um dos pais pode:
(1) transmitir confiança e respeito ao outro genitor, (2) direcionar seu comportamento sobre o bem-estar da criança e não considerá-la como sua posse, (3) estar disposto a fazer concessões, (4) ser capaz de falar com o ex-cônjuge, pelo menos no que diz respeito à criança, (5) reconhecer e aceitar as diferenças entre os genitores, (6) transmitir confiança à criança. (BASTIEN e PAGANI, 1996)
Se estas condições dos pais precedem qualquer estabelecimento de guarda compartilhada, quando a mesma for estabelecida ou homologada por algum organismo formal deve-se, ainda, avaliar se a guarda compartilhada atende aos melhores interesses da criança naquele contexto específico.
Caso a formalização se dê através do Judiciário, alguns outros parâmetros podem ser utilizados para análise da conveniência da medida, tais como os previstos na legislação americana transcritos abaixo:
1) O acordo ou a falta de um acordo entre os pais quanto à guarda conjunta.
2) Se a falta de acordo dos pais seria infundada ou é influenciada por uma questão não relacionada aos melhores interesses da criança.
3) As habilidades passadas, presentes e futuras dos pais em cooperar na tomada de decisões sobre a criança na extensão requerida pelo estabelecimento da guarda conjunta.
4) Se o arranjo de guarda conjunta é logisticamente possível. 6
Além de avaliar tais aspectos, a mesma legislação prevê que o estabelecimento ou a homologação de um acordo de guarda compartilhada deve ser precedido da apresentação, por parte dos genitores, de uma proposta onde estejam previstos: (1) direitos e responsabilidades de cada um; (2) esquema de permanência da criança com cada um; (3) formas de resolução de conflitos ou questões não previamente definidas; (4) previsão de periodicidade de revisão do plano estabelecido; e (5) a compreensão das partes de que “guarda conjunta não significa necessariamente tempo” igual com a criança. 7
A guarda compartilhada pode ser estabelecida a qualquer momento, mas parece-nos que só deve sê-lo se considerar os parâmetros relacionados acima, especialmente no que concerne à capacidade dos pais em cooperarem e se respeitarem mutuamente.
Frente a todos os temas tratados neste texto, e até para dar um final ao mesmo, a seguir faremos alguns comentários quanto à proposta de legislação brasileira da guarda compartilhada.
4 Conclusões e Comentários sobre a Proposta de Legislação Brasileira de Guarda Compartilhada
Conforme todos os estudos e propostas têm destacado, a guarda compartilhada (ou conjunta) deve não só ser regulamentada, quanto buscada nas situações concretas, pois este tipo de arranjo, mais do que qualquer coisa, preserva o direito da criança de conviver com ambos os genitores.
Mais do que direito, a convivência com ambos os genitores é um fator fundamental no desenvolvimento social e psicológico, tendo em vista que é através de nossas famílias de origem, representadas por nossos pais, que nos inserimos na estrutura social, bem como é primordialmente através da relação com ambos, pai e mãe, que construímos nossa subjetividade.
Assim sendo, é mais do que louvável a Proposta de Lei da Promotora de Justiça PATRÍCIA RAMOS “para o Implemento da Guarda Compartilhada dos Filhos no Sistema Jurídico Brasileiro”. 8
Porém, visando colaborar com tal implantação, baseando-nos nos dados apresentados neste texto, e na nossa experiência como Assistente Social Judiciária, faríamos as seguintes observações:
a) com relação à proposta de lei:
1. a definição do que se entende por “guarda compartilhada”, preferencialmente se utilizando a definição de guarda legal compartilhada, 9 tendo em vista que na mesma está previsto o direito de convivência da criança com ambos os genitores ao mesmo tempo que prevê sua permanência em um ambiente estável;
2. uma ressalva para a impossibilidade de estabelecimento ou homologação da guarda compartilhada em casos de violência doméstica comprovada ou presumida;
3. a inclusão da possibilidade do juiz determinar a realização de estudo social, e não só de estudo psicológico, para análise da indicação do estabelecimento da guarda compartilhada; 10 isto, em se considerando que: (1) os Assistentes Sociais têm formação que os habilita à análise das estruturas familiares e (2) a grande maioria das equipes de assessoramento aos Magistrados de Família é composta por Assistentes Sociais.
b) com relação à implantação da guarda compartilhada nos casos concretos
1. a elaboração de critérios, tais como:
- não-estabelecimento em litígios crônicos nos quais o conflito entre o ex-casal está cristalizado e arraigado na sua forma de relacionamento;
- a criação de uma equipe multidisciplinar que: (a) defina os parâmetros para o estabelecimento da guarda compartilhada; (b) crie mecanismos de acompanhamento/apoio da medida; (c) realize um programa de esclarecimento público sobre a guarda compartilhada;
2. seja estabelecido um projeto de análise da eficácia da medida durante pelo menos 5 anos.
Gostaria de terminar dizendo que as medidas sugeridas acima pretendem reconhecer que, mais do que o direito de conviver com ambos os genitores, as crianças merecem que tal convivência se dê liberando-as de qualquer conflito que seus pais tenham entre si. Neste sentido deve se dar nossa ação.
Bibliografia
BASTIEN, Catherine e PAGANI, Linda. “Impact des Facteurs Individuels et Familiaux sur L’Ajustement des Enfants Vivant en Guarde Partagée”. La Revue Canadienne de Psycho- Éducation, volume 25, número 2, 1996.
Disponível em: http://www.rcpe.qc.ca/Articles/article1-25_2.html
GOLDSTEIN, Joseph, et al. The best interests of the child: the last detrimental alternative. New York: The Free Press, 1996.
Proposta de Lei para o Implemento da Guarda Compartilhada dos Filhos no Sistema Jurídico Brasileiro da Promotora de Justiça PATRÍCIA RAMOS. Disponível em: http://www.paisparasemprebrasil.org/page10.html
RABELO, Sofia Miranda. Texto disponível através de grupo de discussão: <SMTP:direitodeconvivencial-owner@yahoogrupos.com.br>. Também pode ser solicitado pelo e-mail: paisparasempre@bol.com.br.
STAHL, Philip Michael. Conducting Child Custody Evaluations: A Comprehensive Guide. SAGE Publications, Thousand Oaks, 1994.